quinta-feira, 29 de setembro de 2011

COM A BIBLIOTECA DO DR. JOSÉ FORMOSINHO . . .

  • Meditando ... :

Émile FAGUET foi um professor, crítico literário e dramático francês, nascido em La Roche-sur-Yon em 1847. Membro da Academia Francesa em 1900 !

Escreveu então um livro que titulou “ . . . E O HORROR DAS RESPONSABILIDADES”, um livro onde analisa profundamente o sistema jurídico francês do seu tempo.

O Dr. José Formosinho, que muito sublinhou, diversas partes mais brilhantes do livro, entendeu amplificar o título original, antepondo-lhe a frase “O CULTO DA INCOMPETÊNCIA . . .” E até parece estarmos na actualidade e em Portugal. Ora veja-se :

- Ideias e costumes jurídicos: Todo o sistema e todos os costumes jurídicos do regime posterior a 1789 são dominados pela ideia geral de que quem julga deve ser irresponsável e de que nada se lhe possa censurar. Com efeito : 1º O juiz não julga pelo espírito de equidade, mas conforme a lei; por outras palavras, é um escrivão e não um juiz; é um homem que diz qual é a lei aplicável a um certo facto previsto por ela; é um homem que ajusta um facto à lei que a ele se adapta exactamente, “cobre” o facto como dizem os alemães e consequentemente dá uma sentença.

Portanto, é absolutamente irresponsável; foi a lei e não ele quem sentenciou; a sentença saíu da lei de um modo, pode-se dizer, automático . A quem poderá, então, o lesado pedir contas ? Evidentemente não será ao juíz; será à lei, se quiser. Ao juíz é impossível; o juíz é estrictamente irresponsável.

* * *

O pretor romano não era somente um homem que citava o direito, era um homem que fazia o direito. Tomando posse do cargo publicava uma espécie de manifesto legislativo edictum prætoris, onde enunciava os princípios gerais de direito que se propunha seguir. Criaram assim, sucessivamente, todo um direito, isto é o direito pretoriano, que se estudou em Roma do tempo de Augusto ao de Papiniano mais do que a legislação dos legisladores e que era o verdadeiro direito, de onde todo o direito romano codificado mais tarde saíu.

Não tenho necessidade de dizer que o direito assim forjado é o mais vivo, é o direito vivo, formado, a pouco e pouco, dos factos e da razão humana aplicada aos factos, esclarecido por análogos factos anteriores, e não saíu de tal ou tal ideia dum legislador, muitas vezes apriorística.

Portanto os pretores romanos eram juízes legisladores, citando e fazendo o direito e os juízes ingleses não deixam de se lhes assemelhar.

Tais juízes têm uma enorme responsabilidade, sentem-na e são mantidos no dever da justiça e na dignidade do magistrado pelo sentimento constante dessa mesma responsabilidade. Sentem que julgam pela equidade esclarecida pelo conhecimento duma vasta jurisprudência, remota, venerável, considerável, que é preciso conhecer e que realmente conhecem, consultam, consideram e veneram. Sentem também que julgam consideravelmente por equidade, pela razão, contribuindo para a formação do direito do país que amam. São tradicionalistas de dois modos, o que é preciso, de resto, sob pena de não serem tradicionalistas senão em parte; são tradicionalistas para o passado por toda a tradição que neles pára e tradicionalistas para o futuro por toda a tradição que deles decorrerá.

* * *

O júri é um grupo de cidadãos investido do direito de julgar durante oito dias, que, primeiro porque não tem nenhum conhecimento jurídico, nem nenhum conhecimento psicológico do criminoso, julga a torto e a direito, quer por opinião política, quer por sensibilidade e conforme a eloquência do ministério público ou do advogado mais impressão lhe tenha feito; e, que, depois, tendo consciência de que julgou a torto e a direito, tem uma tendência em diminuir ainda a responsabilidade quase nula que pesa tão pouco sobre ele e em aumentar a irresponsabilidade quase absoluta de que goza.

É muito raro desde uns dez anos para cá que um júri tendo condenado não assine um recurso de perdão depois de ter condenado.

* * *

- Nos costumes políticos: Há duas coisas na política, a constituição política e os costumes políticos. A constituição política entre os franceses, para começar por ela, é baseada na irresponsabilidade universal. No antigo regime havia uma responsabilidade real; era a do rei. Esquecem-na muito. Mas se o rei era absoluto, o que, de resto, era absurdo, era eternamente e absolutamente responsável. Faziam-lhe sentir isso.

* * *

Somente o clero dizia quase sempre que ela (a realeza) era soberana e só de Deus recebera o seu poder; mas dava-lhe assim uma responsabilidade bem temível; declarava que ela era responsável perante Deus e a ele devia contas do que fizesse contra o povo sem se importar com ele.

Dir-me-ão que esta responsabilidade pode parecer leve, indefinida, porque é infinita e que a realeza poderia dizer como Tartufo: “Se não é senão o céu . . .” Não é preciso entender as coisas assim, nem se deve pensar que o clero tenha dito isto a sós com a realeza e em voz baixa. Disse alto, francamente. É aqui que começa a responsabilidade temporal. Disse alto; o povo ouviu tão bem como o rei e ficou sabendo o que era a responsabilidade real. Governar justamente era um dever para com Deus; porém era mais um dever para com o povo governá-lo como Deus queria que ele fosse governado. Aí se encontrava ainda, embora enfraquecida, a velha intervenção do poder espiritual no poder temporal em nome de Deus soberano, intervenção que muitas vezes fora poderosa e salutar para os príncipes bárbaros. Notai bem que um soberano temente a Deus, embora seja absoluto, sente uma responsabilidade mais forte do que um soberano nomeado pelo povo e dele dependendo nominalmente. Quando a Igreja dizia: “Todo o poder humano vem de Deus” pensa-se geralmente que ela curvava, ela esmagava o povo sob o soberano. Cuidado ! Dizendo ao rei que o poder vinha de Deus, tornava-o de modo terrível responsável perante Deus. O soberano a quem se diz que só depende do povo, pelo contrário, sente que não depende de ninguém, depende do bem êxito, será amado enquanto for feliz, detestado, abandonado, deposto quando a fortuna for contra ele. O soberano que é de Deus fez um pacto com Deus; o que é do povo pactuou com o acaso. É preciso notar bem isto.

* * *

Enfim, a magistratura, mesmo constituída como é, poderia, procurando honestamente e sem impaciência, mas procurando as responsabilidades em vez de fugir delas, desempenhar um papel muito importante, muito útil e aquele que lhe compete. Sem dúvida que a sua própria organização convida-a a apagar-se e a não ser mais que um agente dócil do Governo. O grande vício da magistratura em França é que ela é uma simples carreira, em que se começa muito moço e mal pago e só se avança lentamente se se prestar serviços ao Governo. Portanto, procura-se avançar; é-se dominado por esta ideia e faz-se tudo por ela.

Na Inglaterra a magistratura não é uma carreira ; é o fim duma carreira. São nomeados magistrados os velhos advogados que fizeram toda a sua carreira de advocacia com lustre, que contraíram hábitos de independência que não perdem, e que não desejam avançar, porque avançam muito pouco. Numa palavra o ofício de juiz é uma aposentadoria brilhante e largamente recompensada; porém é uma aposentadoria, uma reforma. O juíz inglês tem todos os motivos e razões para ser independente.

Vê-se que os bons efeitos não são sempre e absolutamente das instituições, mas da sua prática. Não havia nenhuma razão para que na Inglaterra se não fizesse da magistratura uma carreira, o que implicaria todos os inconvenientes que tem na França. Simplesmente não se fez; não se fez por hábito antigo, por costume, pelo confuso sentimento de que não é digno da magistratura ser uma carreira; e assim, sem que haja um texto jurídico sobre o assunto, tem-se uma magistratura excelente.

* * *

Digo no entanto que, mesmo com uma má constituição legal da magistratura, mesmo com o mau hábito de fazer da magistratura uma carreira como qualquer outra, ela seria excelente, se o quisesse. Bastar-lhe-ia ter, mas colectivamente, toda ou mesmo quase toda, o sentimento da sua responsabilidade que é enorme, o sentimento de que é o fecho da abóbada de um país livre; que o cidadão não será livre, se não sentir que o seu direito será mantido, reconhecido, sustentado, defendido contra o poder central por um poder imparcial e independente. Uma magistratura que se penetrasse desta ideia asseguraria a sua independência, bastando para isso afirmá-la e exercê-la.

(Se Deus o permitir continuaremos a meditar viajando pela vasta biblioteca do Dr. José Formosinho)

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

RECORDANDO A VERDADEIRA CHAMINÉ ALGARVIA :

Em 1945, o Dr. José Formosinho iniciou uma campanha destinada a revitalizar a construção “desse tão regional adorno das habitações do nosso Algarve, hoje bastante esquecido em Lagos”, como afirma no “Jornal de Lagos” de 10 de Fevereiro e em que anuncia a abertura de um “CONCURSO DE CHAMINÉS ALGARVIAS”

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   Cerca de um mês depois, chegava ao “Jornal de Lagos” a primeira reacção à notícia, com um forte aplauso à iniciativa por parte de alguém, estudioso-entusiasta da chaminé algarvia, o Dr. Cardoso Martha:     

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Entretanto o Dr. Formosinho corria por esse Algarve fora à procura de exemplares característicos da CHAMINÉ ALGARVIA, desenhando, fotografando, estudando e contactando  o seu Amigo, Prof. Samora Barros que, na Escola Industrial de Silves, ensinava e que era especialista na matéria; dele acolheu alguns preciosos ensinamentos.    São desse tempo os desenhos que o Dr. Formosinho fez e de que, a seguir, se apresentam alguns:

1- estudo de construção  de chaminé algarvia Aqui se indica que a altura total que cada pessoa deseja dar à sua chaminé deve ser dividida em quatro partes iguais, como indicam estes dois primeiros desenhos

2- exemplos de estudos

O 3º desenho indica-nos algumas variantes existentes, em 1945, em Tunes e em Loulé.

 3- estudos diferentes

O desenho seguinte dá-nos já uma indicação das tendências de construção, segundo as épocas, mais antiga, ou mais moderna de então.

 4- diferenças de época

O outro desenho dá-nos uma ideia da maior ou menor inspiração de momento, dos pedreiros que as construíram:

5- e diferenças de locais 

E porque ainda assim algumas dúvidas se suscitassem sobre qual o genuíno material do tipo da verdadeira chaminé algarvia, veio o Dr. Formosinho, cerca de um mês depois, explicar que “de uma maneira geral é indispensável que o seu ornamento principal seja telha e ladrilho. Isto é, o pedreiro ia desenvolvendo o seu trabalho segundo a inspiração de momento, mas só podendo utilizar no seu ornamento a telha e o ladrilho

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chaminé de fábrica-1  ou  chaminé de fábrica-2

Pouco depois era o “Diário do Alentejo” que também manifestava o seu caloroso apoio à iniciativa:

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O Prof. Samora Barros foi posteriormente chamado a fazer palestra sobre a construção das ditas chaminés. Apresentou igualmente séries de desenhos seus, ilustrativos das ditas construções, desenhos que ainda hoje se mantêm no Museu.


Chaminés   chaminés algarvias no Museu



Mostram-se seguidamente fotografias de alguns interessantes exemplares de chaminés algarvias, então existentes em Lagos.

Igualmente se apresentam  o desenho, em planta, do levantamento feito pelo Dr. José Formosinho, dos locais numerados de onde se podiam ver os diversos exemplares fotografados e ainda um seu esboço de estudo de uma chaminé algarvia :

                       locaisde Lagos de onde são vistas as chaminés                         Estudo

 Lagos de 13,15  Lagos de 14, 17,18,19  Lagos de 13,15  Lagos de 13,17

Entretanto na sua própria casa, em Lagos haveria de mandar construir uma chaminé “sui generis” com cata-vento,

                 Lagos casa Dr. José Formosinho     enquanto continuava a colher elementos fotográficos ao longo de todo o Algarve, conseguindo a bela colecção que agora se pode admirar:                              

 Faro-32  Loulé-23  Lagos-15  Faro-38  Almancil-31

Faro-s. núm.  39  Faro-22  Faro-30  43

Faro-21 (2)  36  37 Faro(Almancil)-29 Faro(Almancil)-33

Faro-28  Lagos de 17.34  Faro   Loulé

  Faro-2 SCAN0242 SCAN0243SCAN0244 Lagos  41

 SCAN0245  SCAN0606 SCAN0607 SCAN0608 SCAN0622

 SCAN0624 SCAN0625  SCAN0629  SCAN0630  SCAN0626

 

 SCAN0628 SCAN0633 SCAN0634 SCAN0631

SCAN0636  SCAN0638  SCAN0627 SCAN0637  SCAN0632
SCAN0641SCAN0643 SCAN0645 SCAN0646SCAN0642SCAN0640     SCAN0648SCAN0649 SCAN0644


SCAN0647SCAN0652SCAN0653SCAN0662-R. Gen. Alberto da SilveiraSCAN0651SCAN0635SCAN0650 Loulé-23,27   Loulé-24,25,27 Loulé-26


As inspirações de certos pedreiros foram permitindo construções de magníficos exemplares de chaminés que já deixavam adivinhar o  aparecimento de modelos rendilhados posteriormente  moldados em fábricas (e portanto com menor valor artístico) !        São exemplos de algumas dessas autênticas obras de arte, as que seguidamente se apresentam:

   Caliços-Biogal Estação de Nexe  Esteval

Faro-nuv.  Faro-rend.   S. Lourenço-2 S. Bábara de Nexe

S. Lourenço  S.João da Venda    S.Bárbara N.

A VERDADEIRA CHAMINÉ ALGARVIA !    AÍ FICA PARA RECORDAÇÃO DE UMA ARTE BELA QUE JÁ NÃO VOLTA !